maio 26, 2009

Projeto “Pedras” Geologia e Educação Infantil

Ivna de Sá Roriz de Paula*


Estudar rochas e minerais proporciona um trabalho muito interessante que pode assumir várias interfaces. As "pedras" estão por todas as partes e basta olhar para admirar. E é isso que esse grupo de observadores em potencial fez: reparou a beleza das pedras que os cercam. E simplesmente as crianças começaram a colecioná-las e a indagar sobre seus diversos aspectos. A todo momento elas traziam pedras para mostrar na roda; pegavam em casa, no parquinho da escola, nos passeios que fazíamos; e duas crianças já faziam coleção com os pais – o que contribuiu para aumentar o interesse de toda a turma.
Estávamos no fim do primeiro semestre quando os alunos pediram para estudarmos as pedras, mas havia dois outros projetos em andamento e combinamos que se o desejo de pesquisar as pedras persistisse depois das férias de julho este seria realizado no segundo semestre. E foi impressionante que no primeiro dia de aula, após as férias, eles perguntaram: "E o nosso projeto de pedras?"; e assim ficou o título do projeto, do jeito deles e no entendimento deles.
A partir daí começamos a listar tudo o que já sabíamos sobre as pedras e o que gostaríamos de saber.
O que sabíamos:
• As pedras são encontradas na natureza.
• Existem muitos tipos de pedras, algumas são preciosas.
• As pedras são utilizadas para construir casas, ruas e para colecionar.
• O diamante é muito duro.
• O ouro é muito valioso.
O que queríamos saber:
• O nome das pedras.
• Como saber se uma pedra é valiosa ou não.
• O que é a pedra-sabão? Por que se chama assim se não faz espuma?
• Por que cada pedra é de um jeito?
• "Como é feito o diamante? Como são feitas as pedras?
Todos esses questionamentos possibilitaram o desenvolvimento de um trabalho nos vários campos do conhecimento.
Nosso objetivo geral, a princípio, era o de conhecer as pedras: aspectos físicos (visual e tátil), nomes, propriedades, utilidades e as inúmeras possibilidades de uso, de acordo com nossa imaginação.
Um outro objetivo, de igual importância, era o de desenvolver competências como: a percepção de questões sociais presentes no tema, a capacidade de se trabalhar em grupo e o desenvolvimento de um olhar investigativo e crítico sobre as coisas que os cercam.
Com esse projeto, abrangemos outras áreas do conhecimento e realizamos trabalhos interessantes e significativos para o aprendizado das crianças.


Matemática:
Realizamos atividades com as formas geométricas básicas, planas e tridimensionais. Aproveitando os aspectos da lapidação, realizamos trabalhos tais como dobraduras e montagens de figuras tridimensionais.
Para compreendermos os mapas, fizemos atividades que envolviam o conceito de espaço – medidas e escalas. Um exemplo foi o de desenhar a planta de sua própria casa vista por cima, como se estivessem em um helicóptero. Nessa atividade era preciso a criança se colocar em um outro foco de percepção e sair do estado egocêntrico em que se encontra.
Outros conceitos também foram desenvolvidos, como classificação, seriação e numeração, em outras atividades com as pedras.

Linguagem:
Houve um desenvolvimento da escrita espontânea – em cartas enviadas pelas crianças ao "Caçador de Rochas" e construção de listas; da leitura – nos diversos textos informativos a respeito; da expressão oral e ao vocabulário.

(Geografia):
Coloquei entre parênteses, pois a geografia, apesar de estar integrada em nossa vida cotidiana e ser um campo de estudo, não é área de conhecimento "formalizado" da Educação Infantil. Mas trabalhamos com a leitura de mapas para observar a localização das regiões onde são encontradas as pedras e para nos deslocarmos da escola até o IGc (Instituto de Geociências da UFMG).

Artes:
Houve um desenvolvimento da criatividade e da expressão artística nas diversas técnicas que realizamos. Fizemos mosaicos com azulejos, aquarelas com as formas geométricas, serigrafias, pinturas em pedras, confecção de colares e anéis com pedras e miçangas e modelagens em argila.
* * *
Mas tudo começou com uma carta anônima enviada para a turma de um "Caçador de Rochas" misterioso:



"EI PESSOAL DA TURMA DA MÔNICA! FIQUEI SABENDO QUE VOCÊS ESTÃO QUERENDO ESTUDAR SOBRE AS PEDRAS E EU ADORARIA AJUDAR VOCÊS.
SABEM, EU JÁ VIAJEI O MUNDO TODO ATRÁS DE PEDRAS PARA COMPLETAR A MINHA COLEÇÃO. SEI QUE VOCÊS TÊM COLEGAS QUE TAMBÉM ESTÃO FAZENDO UMA COLEÇÃO E É MUITO LEGAL. TEM CADA UMA MAIS LINDA QUE A OUTRA. VOCÊS SABIAM QUE POR CAUSA DESTA BELEZA DAS PEDRAS MUITOS HOMENS JÁ MATARAM E MORRERAM? AS PEDRAS PRECIOSAS TRAZEM RIQUEZA PARA UNS E POBREZA PARA OUTROS, ALEGRIA E TRISTEZA TAMBÉM. EXISTEM AQUELAS PESSOAS QUE GOSTAM SOMENTE DE ESTUDÁ-LAS: SÃO OS GEÓLOGOS. ELES TAMBÉM SÃO CHAMADOS DE "CAÇADORES DE ROCHAS".
MAS VOCÊS SABEM O QUE SÃO AS PEDRAS? COMO ELAS APARECERAM NA NATUREZA? E POR QUE É IMPORTANTE ESTUDAR AS ROCHAS? AH, EU VOU CONTAR PARA VOCÊS, MAS SÓ NUMA OUTRA CARTA. AGUARDEM, QUE EU MANDO MAIS NOTÍCIAS.
ABRAÇOS,
‘CAÇADOR DE ROCHAS’"

E assim a turma foi recebendo essas cartas (escritas por mim) com esse pseudônimo. Elas tiveram o papel de dar às crianças as respostas "teóricas" às perguntas que elas faziam em suas cartas. E também visavam abordar questões sociais, como as que envolvem o garimpo, a busca de pedras preciosas, riqueza de uns e pobreza de muitos, etc. Tudo isso fomentava as discussões que realizávamos nas nossas rodas diárias. O Caçador manteve um constante diálogo com as crianças, incentivando-as a escrever para ele; e dessa forma a turma foi desenvolvendo a produção de texto. Todas as cartas eram colocadas em uma urna, como se fosse uma caixa de correio da sala, e todas as sextas-feiras eu a abria e entregava as correspondências, que também eram para outros colegas ou para mim. As do "Caçador de Rochas", eu dizia que ia entregar pessoalmente a ele, e as levava para casa para responder.
Em uma reunião de pais para a apresentação do projeto em andamento, uma mãe, que é da área de geografia, indicou-me o professor Cláudio Scliar para assumir a identidade do "Caçador de Rochas". Assim que ele soube, apaixonou-se logo pela idéia e trouxe outros cinco alunos dele para esta aventura na Educação Infantil.
Os parceiros do professor Cláudio realizaram vários encontros com as crianças, e neles era perceptível o carinho e o cuidado de se transmitir conceitos tão densos de uma maneira simples e com um vocabulário acessível às crianças. Preocuparam-se também em respeitar e alimentar o encantamento do grande segredo, que era a identidade do "Caçador de Rochas". Elaboraram convites para que as crianças visitassem o IGc/UFMG, o Museu e a Gruta da Lapinha, tudo em nome do "Caçador".
Depois de todas as etapas do projeto serem realizadas, chegou o grande dia – o de conhecer a identidade do "Caçador de Rochas". O encontro foi emocionante, os olhinhos das crianças brilhavam. Fizemos uma grande roda com o professor Cláudio e seus assistentes e conversamos bastante; uma das crianças perguntou ao "Caçador de Rochas": – Qual é a pedra mais preciosa? E ele sabiamente respondeu: – A pedra mais preciosa é aquela que você gosta mais por algum motivo especial, ou porque foi alguém muito especial que lhe deu. E assim as crianças perceberam que cada um tinha sua pedra preciosa.
Foi uma experiência valiosíssima o desenvolvimento deste projeto e acredito que marcante na vida de cada criança.

*Ivna de Sá Roriz de Paula é professora de Educação Infantil do Centro de Desenvolvimento da Criança, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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