O Peixinho de Ouro
Em uma ilha distante daqui, a Ilha Buián, viviam um pescador e sua esposa. Muito velhos e muito pobres, tinham apenas sua cabana para viver e uma rede que o homem fizera com suas próprias mãos para pescar.
Um dia, ao mar, o homem sentiu que a rede lhe vinha mais pesada. E, pensando na boa pescaria que fizera, veio puxando, puxando a rede, puxando com toda a sua força... entre as malhas, a mesma água, o mesmo sal, e um peixinho do tamanho de quase nada. No entanto, não era um peixe comum: suas escamas eram de puro ouro.
O velho pescador já ia agarrá-lo quando o animaleto assim falou:
"Não me leves, avozinho... Deixa-me livre nas águas do mar que te serei de grande valia. Tudo o que desejares, dar-te-ei em recompensa."
Embora perdesse a pesca e o almoço, o velho respondeu:
"Vai-te embora, não preciso nada de ti. Vive em paz no mar!"
Voltando para casa, o homem viu viu que a velha lhe esperava à porta. "E que tal foi a pesca hoje?" Sem dar importância ao ocorrido, foi contando...
__ Que velho mais idiota! Tivestes a sorte entre as mãos e não soubestes aproveitar! Ao menos, tivesses pedido um bocado de pão... com o que havemos de forrar o estômago, se não há nesta casa nem uma pobre migalha?
E a velha brigou o dia inteiro com o marido -- até que ele, não podendo mais ouvir sua voz, foi à beira-d'água:
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
O peixe de ouro nadou em sua direção:
"O que desejas, bom velho?"
__ Minha mulher está zangada e diz querer pão.
"Volta para casa que pão não vos faltará."
Ao chegar, o velho encontrou a mulher mais brava do que antes. (Ela era do tipo difícil de agradar!) Pão havia de sobra, uma gaveta cheia. O que agora ela queria era uma tina nova -- a madeira havia rachado e ela não tinha onde lavar a roupa:
__ Vai dizer ao tal peixe que nos providencie uma!
O homem obedeceu e, mais uma vez, foi à praia:
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
O peixe de ouro veio a nadar.
"E o que desejas, meu bom velho?"
__ Minha mulher precisa de uma tina nova.
"Volta para casa que a tina nova lá está."
O pescador estava ainda uns vinte passos de cabana, a mulher correu ao seu encontro:
__ Vá imediatamente falar com o peixe e peça-lhe que construa uma casa nova para nós! Aqui já é impossível alguém morar...
Girando nos calcanhares, o homem voltou ao mar. Repetiu as mesmas palavras (que você já sabe, por isso não vou repetir) e o peixe apareceu, dourado e solícito como sempre. No entanto, de novo em casa, o pobre do pescador viu sua esposa soltando fumaça pelas orelhas:
__ Quão estúpido tu me vens! Esta casa é muito pequena! Não a quero! Vai outra vez ter com o tal peixinho de ouro e faça-o saber que não quero ser mais uma camponesa: quero ser esposa de governador, ter uma casa decente para morar!
Mais uma vez, lá foi o bom velho:
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
O peixe nadou até a margem e assim fez, a cauda na água e a cabeça ao céu a falar:
"Que agora desejas?"
__ Minha mulher deve estar maluca: ela não me deixa em paz. Diz que já não quer ser camponesa, prefere ser esposa de governador.
"Não te aflijas, que tudo estará resolvido."
Ao voltar, não mais encontrou a velha cabana, nem outra mais nova sequer... Erguia-se, no mesmo terreno, uma mansão de três andares, contruída sobre largas bases de pedra. Sim, o peixe de ouro havia atendido com prontidão a mais esse pedido. Foi achegando-se e os criados vieram recebê-lo no pátio, perguntou por sua esposa... não tardou por encontrá-la refestaleda em uma poltrona, toda vestida em luxo.
__ Como estás, minha esposa? Contente?
__ Tens o atrevimento de chamar-me tua mulher, justo a mim, mulher do governador?
E assim dizendo, deu ordens aos criados para despejarem-no à rua. Lá fora, o pescador levou boa surra com paus e cordas. Apanhou de tal jeito que, só com muito custo, conseguiu ficar de pé outra vez... e, além de tudo, foi nomeado varredor da casa, obrigado à vassoura e a deixar o pátio sempre limpo... se encontrassem uma folhinha no chão ou qualquer sujeira sequer, deciam-lhe o pau!
Foi vivendo assim humilhado até o dia em que a esposa do governador quis vê-lo pessoalmente. Já estava cansada daquela vida.
__ Vai, agora mesmo, velho tonto, falar com o teu peixe. Desejo ser czarina para toda gente me obedecer e respeitar! Devo morar em um palacete e todos deverão se inclinar quando me virem passar! Andas, sem demora!
E foi ao mar ao pescador e veio à praia o peixe de ouro.
Tudo se fez como contam as palavras... e, naquele mesmo lugar, onde muito tempo atrás existiu uma cabana, no lugar dela, estava um palácio coberto com telhas de ouro. Sentinelas tomavam conta à porta. E ele entrou por um rico jardim, viu muito mais criados correndo de um lado para o outro. Na cozinha, descobriu-se um bom cheiro pelo ar, preparavam um banquete. E cada vez mais ressabiado, o pescador procurou pela mulher.
Ela, estava lá, no alto de uma esplanada, entre nobres e generais, passando revista às tropas. Tambores e trompetes faziam soar o hino do Czar...
O pescador desistiu de falar-lhe, procurou pela vassoura e ficou bem quieto em seu posto.
Mas não demorou para que a velha esposa se entendiasse com toda aquela vida de riqueza e honrarias; então, ordenou que trouxessem o pescador à sua presença. Nobres, generais, soldados e criados colocaram-se em polvorosa pois ninguém jamais havia ouvido falar de tal pessoa entre os afetos da czarina... Foi com muita dificuldade que conseguiram encontrar o bom velho, levado imediatamente para o salão do trono.
__ Tens sorte de ainda viver para ver-me deusa dos mares. Este é meu desejo, comandar toda gente que vive sob as águas. Sem demora, retornas ao peixe e ordene-lhe!
Coração muito apertado, o pescador obedeceu.
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
Mas o peixe de ouro não apareceu na primeira chamada, nem na segunda, nem na terceira...
Foi então que o mar se ergueu, ondas revoltas, o azul ficando escuro. As águas ficaram irreconhecíveis e, neste momento, o peixe de ouro chegou à beira-praia:
"Que mais queres, bom velho?"
E ele tudo foi contando como havia acontecido, mas o peixe, sem mais nada dizer, deu as costas e... desapareceu nas profundezas do mar!
O pobre pescador foi-se também embora, pensando na guilhotina à espera de seu pescoço. Mas, chegando, que surpresa encontrou no lugar do palácio: a velha cabana, pequena e mal-acabada, sua mulher sentada num toco de árvore remendando uma roupa por costurar. Tudo de volta ao mesmo lugar, toda vida como era antes.
Pescando dia após dia, o velho, a rede e o mar, nunca mais teve a mesma sorte de encontrar seu amigo de ouro.
Um dia, ao mar, o homem sentiu que a rede lhe vinha mais pesada. E, pensando na boa pescaria que fizera, veio puxando, puxando a rede, puxando com toda a sua força... entre as malhas, a mesma água, o mesmo sal, e um peixinho do tamanho de quase nada. No entanto, não era um peixe comum: suas escamas eram de puro ouro.
O velho pescador já ia agarrá-lo quando o animaleto assim falou:
"Não me leves, avozinho... Deixa-me livre nas águas do mar que te serei de grande valia. Tudo o que desejares, dar-te-ei em recompensa."
Embora perdesse a pesca e o almoço, o velho respondeu:
"Vai-te embora, não preciso nada de ti. Vive em paz no mar!"
Voltando para casa, o homem viu viu que a velha lhe esperava à porta. "E que tal foi a pesca hoje?" Sem dar importância ao ocorrido, foi contando...
__ Que velho mais idiota! Tivestes a sorte entre as mãos e não soubestes aproveitar! Ao menos, tivesses pedido um bocado de pão... com o que havemos de forrar o estômago, se não há nesta casa nem uma pobre migalha?
E a velha brigou o dia inteiro com o marido -- até que ele, não podendo mais ouvir sua voz, foi à beira-d'água:
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
O peixe de ouro nadou em sua direção:
"O que desejas, bom velho?"
__ Minha mulher está zangada e diz querer pão.
"Volta para casa que pão não vos faltará."
Ao chegar, o velho encontrou a mulher mais brava do que antes. (Ela era do tipo difícil de agradar!) Pão havia de sobra, uma gaveta cheia. O que agora ela queria era uma tina nova -- a madeira havia rachado e ela não tinha onde lavar a roupa:
__ Vai dizer ao tal peixe que nos providencie uma!
O homem obedeceu e, mais uma vez, foi à praia:
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
O peixe de ouro veio a nadar.
"E o que desejas, meu bom velho?"
__ Minha mulher precisa de uma tina nova.
"Volta para casa que a tina nova lá está."
O pescador estava ainda uns vinte passos de cabana, a mulher correu ao seu encontro:
__ Vá imediatamente falar com o peixe e peça-lhe que construa uma casa nova para nós! Aqui já é impossível alguém morar...
Girando nos calcanhares, o homem voltou ao mar. Repetiu as mesmas palavras (que você já sabe, por isso não vou repetir) e o peixe apareceu, dourado e solícito como sempre. No entanto, de novo em casa, o pobre do pescador viu sua esposa soltando fumaça pelas orelhas:
__ Quão estúpido tu me vens! Esta casa é muito pequena! Não a quero! Vai outra vez ter com o tal peixinho de ouro e faça-o saber que não quero ser mais uma camponesa: quero ser esposa de governador, ter uma casa decente para morar!
Mais uma vez, lá foi o bom velho:
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
O peixe nadou até a margem e assim fez, a cauda na água e a cabeça ao céu a falar:
"Que agora desejas?"
__ Minha mulher deve estar maluca: ela não me deixa em paz. Diz que já não quer ser camponesa, prefere ser esposa de governador.
"Não te aflijas, que tudo estará resolvido."
Ao voltar, não mais encontrou a velha cabana, nem outra mais nova sequer... Erguia-se, no mesmo terreno, uma mansão de três andares, contruída sobre largas bases de pedra. Sim, o peixe de ouro havia atendido com prontidão a mais esse pedido. Foi achegando-se e os criados vieram recebê-lo no pátio, perguntou por sua esposa... não tardou por encontrá-la refestaleda em uma poltrona, toda vestida em luxo.
__ Como estás, minha esposa? Contente?
__ Tens o atrevimento de chamar-me tua mulher, justo a mim, mulher do governador?
E assim dizendo, deu ordens aos criados para despejarem-no à rua. Lá fora, o pescador levou boa surra com paus e cordas. Apanhou de tal jeito que, só com muito custo, conseguiu ficar de pé outra vez... e, além de tudo, foi nomeado varredor da casa, obrigado à vassoura e a deixar o pátio sempre limpo... se encontrassem uma folhinha no chão ou qualquer sujeira sequer, deciam-lhe o pau!
Foi vivendo assim humilhado até o dia em que a esposa do governador quis vê-lo pessoalmente. Já estava cansada daquela vida.
__ Vai, agora mesmo, velho tonto, falar com o teu peixe. Desejo ser czarina para toda gente me obedecer e respeitar! Devo morar em um palacete e todos deverão se inclinar quando me virem passar! Andas, sem demora!
E foi ao mar ao pescador e veio à praia o peixe de ouro.
Tudo se fez como contam as palavras... e, naquele mesmo lugar, onde muito tempo atrás existiu uma cabana, no lugar dela, estava um palácio coberto com telhas de ouro. Sentinelas tomavam conta à porta. E ele entrou por um rico jardim, viu muito mais criados correndo de um lado para o outro. Na cozinha, descobriu-se um bom cheiro pelo ar, preparavam um banquete. E cada vez mais ressabiado, o pescador procurou pela mulher.
Ela, estava lá, no alto de uma esplanada, entre nobres e generais, passando revista às tropas. Tambores e trompetes faziam soar o hino do Czar...
O pescador desistiu de falar-lhe, procurou pela vassoura e ficou bem quieto em seu posto.
Mas não demorou para que a velha esposa se entendiasse com toda aquela vida de riqueza e honrarias; então, ordenou que trouxessem o pescador à sua presença. Nobres, generais, soldados e criados colocaram-se em polvorosa pois ninguém jamais havia ouvido falar de tal pessoa entre os afetos da czarina... Foi com muita dificuldade que conseguiram encontrar o bom velho, levado imediatamente para o salão do trono.
__ Tens sorte de ainda viver para ver-me deusa dos mares. Este é meu desejo, comandar toda gente que vive sob as águas. Sem demora, retornas ao peixe e ordene-lhe!
Coração muito apertado, o pescador obedeceu.
__ Peixe, peixinho, vem cá! Vira a cabeça para mim e põe o rabo para o mar!
Mas o peixe de ouro não apareceu na primeira chamada, nem na segunda, nem na terceira...
Foi então que o mar se ergueu, ondas revoltas, o azul ficando escuro. As águas ficaram irreconhecíveis e, neste momento, o peixe de ouro chegou à beira-praia:
"Que mais queres, bom velho?"
E ele tudo foi contando como havia acontecido, mas o peixe, sem mais nada dizer, deu as costas e... desapareceu nas profundezas do mar!
O pobre pescador foi-se também embora, pensando na guilhotina à espera de seu pescoço. Mas, chegando, que surpresa encontrou no lugar do palácio: a velha cabana, pequena e mal-acabada, sua mulher sentada num toco de árvore remendando uma roupa por costurar. Tudo de volta ao mesmo lugar, toda vida como era antes.
Pescando dia após dia, o velho, a rede e o mar, nunca mais teve a mesma sorte de encontrar seu amigo de ouro.
Conto russo adaptado por Peter O'Sagae
Bola de Manteiga
ERA UMA VEZ um casal de camponeses que morava numa cabana junto a uma grande floresta. Eles tinham um filho, tão gordinho que era conhecido de todos como Bola de Manteiga. E tinham também um cachorrinho, pequeno de porte mas forte de voz, que atendia pelo nome de Dente de Ouro.
Certa tarde, em que o pai do Bola de Manteiga havia ido à floresta cortar lenha e a mãe estava às voltas com seus afazeres na cozinha, o Dente de Ouro começou a latir, a latir muito. __ Vá lá fora ver o que está acontecendo, meu filho - disse a mãe do Bola de Manteiga. O Bola de Manteiga espiou pela porta, mas voltou correndo para dentro da cozinha. __ Mãe, mãe! É uma troll horrível, com a cabeça debaixo do braço e um saco nas costas e está vindo pra cá! __ Ih, meu filho, esconda-se logo debaixo da mesa da cozinha - disse a mãe. Mas a Troll chegou até a porta e bateu: Pã, pã, pã! E não teve outro jeito: a mãe do Bola de Manteiga foi atender. __ Boa tarde, minha senhora, o que deseja? __ Boa tarde - disse a Troll. - Por acaso o Bola de Manteiga está? __ Não, infelizmente, ele saiu. Foi até a floresta com o pai, ajudar a cortar lenha - mentiu a mãe. __ Que pena! - disse a Troll. - Eu tenho aqui uma faquinha de prata que eu queria tanto dar de presente pra ele! Pelo visto, vou ter que achar outro menino pra presentear. __ Oi, oi, aqui estou eu! - disse o Bola de Manteiga, saindo debaixo da mesa. __ Que bom que você está aí, meu filho! - disse a Troll. - Mas, sabe o que é, acordei hoje com um dor terrível nas costas. Você não quer entrar aqui neste saco e pegar a faquinha você mesmo? O Bola de Manteiga não pensou duas vezes e enfiou-se saco adentro. Quando a Troll percebeu que o garoto estava todo dentro do saco, esqueceu-se das dores nas costas, pegou o saco, jogou-o sobre o ombro e foi-se embora, bem rapidinho. Mas era um tarde quente. Os borrachudos zuniam por toda parte, o Bola de Manteiga era mesmo bastante pesadinho, e a Troll tinha apenas um braço disponível para segurar o saco. Por isso, depois de andar um tanto, resolveu encostar num barranco, para descansar um pouco. E, não demorou muito, acabou cochilando. Quando o Bola de Manteiga percebeu a respiração regular da Troll, pegou a faquinha de prata, cortou um rombo no saco, saiu, enfiou lá dentro um toco de árvore, amarrou o lugar do corte e foi correndo de volta para a casa de seus pais. Daí a pouco, a Troll acordou. Percebeu que o tempo havia passado e, sem pensar noutra coisa, pegou de novo no saco e foi andando, no trote, até chegar em casa, onde sua filha já estava com o caldeirão no fogo. __ Onde você esteve todo esse tempo, mãe! - perguntou a Trolleta. - A água que a senhora me mandou pôr pra ferver já secou quase toda! A Troll fez a filha colocar mais água e adicionar sal, pimenta, cebola, batata e cenoura. Quando a água chegou ao ponto de fervura, a Troll pôs a cabeça na mesa da cozinha e, com as duas mãos livres, pegou no saco e foi despejar o Bola de Manteiga no caldeirão. Mas o toco de árvore que saiu do saco espalhou água fervente para tudo quanto é canto, queimou as mãos e o rosto da Trolleta, apagou o fogo e só não fez mal à Troll porque ela havia deixado sua cabeça longe do corpo. E passaram-se alguns dias. Mas, numa outra tarde, de grande mormaço, quando o pai do Bola de Manteiga havia saído para caçar, a mãe do Bola de Manteiga estava na cozinha, assando pão, e o seu menino, como de costume, brincando e azucrinando a paciência. De repente, ouviram o latido forte e zangado do Dente de Ouro. __ Vá lá fora ver o que está acontecendo, meu filho - disse a mãe do Bola de Manteiga. O Bola de Manteiga espiou pela porta, mas voltou correndo para dentro da cozinha. __ Mãe, mãe! É aquela Troll horrível de novo, com a cabeça debaixo do braço e um saco nas costas e está vindo pra cá! __ Ih, meu filho, esconda-se logo debaixo da mesa da cozinha, - disse a mãe. Mas a Troll chegou até a porta e bateu: Pã, pã, pã! E não teve outro jeito: a mãe do Bola de Manteiga foi atender. __ Boa tarde, minha senhora, o que deseja? __ Boa tarde - disse a Troll. - Por acaso o Bola de Manteiga está? __ Não, infelizmente, ele saiu. Foi até a floresta com o pai, ajudar na caçada - mentiu a mãe. __ Que pena! - disse a Troll. - Eu tenho aqui um garfinho de prata que eu queria tanto dar de presente pra ele! Pelo visto, vou ter que achar outro menino pra presentear. __ Oi, oi, aqui estou eu! - disse o Bola de Manteiga, saindo debaixo da mesa. __ Que bom que você está aí, meu filho! - disse a Troll. - Mas, sabe o que é, quando me levantei hoje, dei um mau jeito na cintura. Você não quer entrar aqui neste saco e pegar o garfinho você mesmo? O Bola de Manteiga não pensou duas vezes e enfiou-se saco adentro. Quando a Troll percebeu que o garoto estava todo dentro do saco, esqueceu-se do mau jeito da cintura, pegou o saco, jogou-o sobre o ombro e foi-se embora, bem rapidinho. Mas o calor da tarde, o zunido dos insetos e o peso do Bola de Manteiga, que certamente não havia emagrecido desde a última vez, tudo isso fez a Troll sentir-se sonolenta, cansada. E, depois de um par de léguas, resolveu encostar num barranco, para descansar um pouco. Não demorou muito, acabou cochilando. Quando o Bola de Manteiga percebeu a respiração regular da Troll, pegou o garfinho de prata, fez um furo no saco, saiu, enfiou lá dentro uma pedra bem grande, amarrou o lugar do furo e foi correndo de volta para a casa de seus pais. Daí a pouco, a Troll acordou. Percebeu que o tempo havia passado e, sem pensar noutra coisa, pegou de novo no saco e foi andando, no trote, até chegar em casa, onde sua filha já estava com o caldeirão no fogo. __ Onde você esteve todo esse tempo, mãe! - perguntou a Trolleta. - A água que a senhora me mandou pôr pra ferver já secou quase toda! A Troll fez a filha colocar mais água e adicionar sal, pimenta, cebola, batata e cenoura. Quando a água chegou ao ponto de fervura, a Troll pôs a cabeça na mesa da cozinha e, com as duas mãos livres, pegou no saco e foi despejar o Bola de Manteiga no caldeirão. Mas a pedra que saiu do saco espalhou água fervente para tudo quanto é canto, queimou as mãos e o rosto da Trolleta, rachou o caldeirão no meio e apagou o fogo. Dessa vez, a Troll ficou furiosa e jurou que da próxima o Bola de Manteiga não escapava. E passaram-se mais alguns dias, parece até que pouco mais de uma semana. Foi daí que, numa outra tarde, em que o verão parecia estar dando seu último sobressalto de maior calor, quando o pai do Bola de Manteiga havia saído para a floresta para colher frutos silvestres, a mãe do Bola de Manteiga estava na cozinha, preparando conservas, e o Bola de Manteiga, para variar, fazendo das suas. Subitamente, ouviram o latido zangado do Dente de Ouro. __ Vá lá fora, meu filho, e veja por que o Dente de Ouro está latindo tanto - disse a mãe do Bola de Manteiga. O Bola de Manteiga espiou pela porta, mas voltou correndo para dentro da cozinha. __ Mãe, mãe! É aquela Troll horrível de novo, com a cabeça debaixo do braço e um saco nas costas! __ Ih, meu filho, esconda-se logo debaixo da mesa da cozinha - disse a mãe. Mas a Troll chegou até a porta e bateu: Pã, pã, pã! E não teve outro jeito: a mãe do Bola de Manteiga foi atender. __ Boa tarde, minha senhora, o que deseja? __ Boa tarde - disse a Troll. - Por acaso o Bola de Manteiga está? __ Não, infelizmente, ele saiu. Foi à floresta com o pai, ajudar a colher amoras - mentiu a mãe. __ Que pena! - disse a Troll. - Eu tenho aqui uma colherinha de prata que eu queria tanto dar de presente pra ele! Pelo visto, vou ter que achar outro menino pra presentear. __ Oi, oi, aqui estou eu! - disse o Bola de Manteiga, saindo debaixo da mesa. __ Que bom que você está aí, meu filho! - disse a Troll. - Mas, sabe o que é, acordei hoje com um reumatismo terrível nas juntas. Você não quer entrar aqui neste saco e pegar a colherinha você mesmo? O Bola de Manteiga não pensou duas vezes e enfiou-se saco adentro. Mas, quando a Troll percebeu que o garoto estava todo dentro do saco, esqueceu-se do reumatismo, pegou o saco, jogou-o sobre o ombro e foi-se embora, bem rapidinho. E dessa vez ela não ia se deixar enganar e, apesar do calor e do peso do Bola de Manteiga, foi num trote só, por entre atalhos e caminhos pedregosos, até chegar à sua casa. Lá chegando, a Troll largou o saco com o Bola de Manteiga num canto da cozinha e disse para sua filha, a Trolleta: __ Vou agora me arrumar para ir à missa e, quando voltar, vão vir comigo uns vizinhos para jantar. Enquanto eu estiver fora, você me prepare um bom ensopado de Bola de Manteiga, do jeito que eu te ensinei. __ Sim, mamãe - disse a Trolleta e apressou-se a pôr o caldeirão no fogo, enquanto a Troll se arrumava e saía. Quando a água do caldeirão já estava fervendo e a Trolleta já havia colocado os temperos, a batata e a cenoura, ela abriu o saco; e lá estava o Bola de Manteiga, sentado, bem quietinho. Mas a Trolleta ficou apenas olhando para ele, com o olhar aparvalhado. __ O que é que foi? - perguntou o Bola de Manteiga. - Por que você está me olhando assim? __ É que eu tenho que fazer ensopado de você - disse a Trolleta. - E não sei como tenho que fazer para te matar e picar. __ Ora, isso é muito fácil - disse o Bola de Manteiga. - Quer que eu te mostre? __ Quero, quero sim - disse a Trolleta. __ Você tem algum machado por aí? __ Tem um que fica junto do monte de lenha, atrás do celeiro. __ Então, traga o machado aqui - instrui Bola de Manteiga. E, quando a Trolleta voltou, disse-lhe: __ Agora, deite a cabeça em cima daquele banquinho. E a tonta da Trolleta fez o que o Bola de Manteiga lhe disse e ele, mais do que depressa, desferiu-lhe um golpe e cortou-lhe a cabeça. Então, o Bola de Manteiga ajeitou a cabeça da Trolleta na cama e forrou com cobertores e acolchoados, para dar impressão de que ela estava deitada, dormindo. Com o resto da Trolleta, preparou o ensopado que a Troll havia encomendado. Depois, pegou o toco de árvore e a pedra, subiu com os dois para o telhado e ficou esperando. Depois de algum tempo, a Troll voltou da missa com o casal de trolls vizinhos. Quando abriram a porta, cheiraram o ar e foram logo dizendo: __ Huum... que cheirinho bom de ensopado de Bola de Manteiga! - E lá do telhado, chaminé abaixo, o Bola de Manteiga sussurrou: __ Que cheirinho bom de ensopado de Trolleta! Os trolls ouviram, mas, como tudo parecesse em ordem, fizeram de conta que nada acontecera. Viram a Trolleta na cama e, certos de que ela estava descansando depois de ter preparado o jantar, entraram na cozinha, destamparam o caldeirão e foram logo pegando um colher de pau para experimentar o caldo. E cada um que tomava uma colherada do caldo ia dizendo: __ Huum... que caldo gostoso de Bola de Manteiga! E o Bola de Manteiga, lá do telhado, retrucava, a cada vez, chaminé abaixo: __ Que caldo gostoso de Trolleta! Então, os trolls ficaram cismados e correram até a porta para ver o que estava acontecendo. Mas, quando suas cabeças apareceram do lado de fora, o Bola de Manteiga deixou cair o toco de árvore e a pedra e matou-os todos. A seguir, o Bola de Manteiga desceu e, percorrendo a casa de cômodo em cômodo, juntou o ouro e toda a prata que conseguiu carregar e voltou para a casa de seus pais, que nunca mais passaram qualquer necessidade.
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